sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

"Falésias praias areais ardentes"


Para deixar-vos tenho o meu orgulho
que para vos deixar não tenho nada
ensinei-vos o mar o verão o julho
o alvoroço da pesca e da alvorada
os pássaros a caça o doce arrulho
do instante que passa e é tudo e é nada.

Para deixar-vos tenho a liberdade
um astro a lucidar dentro do não
o riso e seu esplendor a intensidade
da vida que se dança um só verão
o fulgor dessa breve eternidade
o azul o vento o espaço a solidão.

Para deixar-vos nada que deixar
só um país e as ilhas adjacentes
um rectãngulo inteiro e ainda o mar
as montanhas os rios e afluentes
as índias que ficaram por achar
falésias praias areais ardentes.

Para deixar-vos tenho o que não tenho
que para vos deixar não tenho mais
do que a escrita da vida e o eco estranho
de ritmos sons e signos e sinais
metáforas que têm o tamanho
do mundo que vos deixo. E nada mais.

Manuel Alegre
fotografia- Zacarias da Mata

2 comentários:

Anónimo disse...

Belos, como sempre. De que livro é o poema? (se souber). Obrigada

almagrande disse...

Olá Mafalda, foi retirado do "Livro do Português errante" do autor.