quarta-feira, 14 de abril de 2010

"Ria"



"Mergulharam ambos num silêncio que estava de acordo com a paisagem.Tinham pedido o pequeno-almoço para o quarto e acabavam de o tomar na varanda. O domingo amanhecera sob um lençol de névoa que mais uma vez lhes fazia evocar a adolescência naquelas praias, à espera que o sol abrisse depois do meio-dia. Respiravam o ar húmido da ria com uma sensação de clandestinidade, como se aquele mato cinzento os escondesse do mundo exterior e os protegesse de toda a gente, das ameaças da vida terrestre.
- Parece que estamos num barco.
Ela concordou. Sim, parecia-lhe que estavam os dois sozinhos num barco, mas num barco sem remos nem motor, nem leme, nem velas. Um barco à deriva , que apenas vogasse ao sabor das águas num grande lago estagnado, envolto num nevoeiro tão espesso como o que pouco a pouco fora cobrindo as suas vidas, sem que os deixasse descortinar uma saída. Era talvez uma antevisão da eternidade, o prenúncio de um tempo já sem tempo, em que o passado e o futuro pareciam flutuar à superfície daquela água invisível que os rodeava."
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Fernando Pinto do Amaral in Fim-de-Semana

2 comentários:

Marieke disse...

Diálogo em texto intimista..próprio dos recantos da nossa Ria
Um abraço
marieke

almagrande disse...

Olá Marieke, um abraço.